Em novembro de 2019, a Coalizão Direitos na Rede já havia se manifestado pedindo cautela aos deputados na análise do PL 3.443/2019, que dispõe sobre a Prestação Digital dos Serviços Públicos na Administração Pública. A nossa sugestão de se criar uma Comissão Especial para analisar a proposta foi uma forma de tentar estabelecer um diálogo concreto com a sociedade. No entanto, não houve esforços para ampliar o debate e, novamente, o projeto pode ser colocado em votação de maneira açodada e sem diálogo.
Confira abaixo a Nota emitida pela CDR no dia 5 de novembro de 2019:
A Coalizão Direitos na Rede, uma articulação formada por 40 entidades do terceiro setor, especialistas e acadêmicos, que atuam na defesa do direito ao acesso à Internet, pelo respeito à privacidade e à liberdade de expressão na rede e que historicamente tem contribuído com o debate sobre inclusão digital, acesso à banda larga, e na construção do arcabouço legal para a proteção de dados no país, vem por meio desta se posicionar sobre o PL 3.443/2019.
A eficiência do poder público e o atendimento de qualidade ao cidadão são objetivos almejados por todos. O uso de tecnologias da informação para esse propósito pode ser um fator de melhoria na relação entre Estado e sociedade, mas também pode ser elemento de aprofundamento das assimetrias de poder, fragilizando direitos do cidadão se seu uso não for amplamente debatido e caso sua aplicação não seja realizada com transparência. Esse perigo torna-se ainda maior em uma economia fortemente baseada em dados, porque o Estado pode impor a coleta e tratamento de dados, o que torna a questão mais grave. O cidadão está refém do Estado e, por isso, a ele deve ser assegurado o maior cuidado no tratamento de seus dados por parte do poder público.
A Coalizão Direitos na Rede sugere, portanto, CAUTELA na aprovação do projeto de lei 3443/2019, o chamado PL do Governo Digital.
A urgência em sua aprovação pode significar a violação do princípio da autodeterminação informacional e do direito à proteção de dados que este mesmo Congresso trabalhou intensamente nos últimos anos através da construção da Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPD). Neste momento, este parlamento se debruça para incluir o tema como direito fundamental na Constituição Federal, através da PEC 017/19.
Cabe ressaltar, também, que o desvio de finalidade proposto para usar o Fundo de Universalização dos Serviços de Telecomunicações (FUST) não é pouca coisa. Conforme o MCI, o acesso à Internet é essencial para o exercício da cidadania e utilizar recursos que deveriam garantir a universalização do acesso para promover a digitalização dos serviços públicos, cada vez mais comprometidos, pode gerar um cenário no qual somente uma parcela dos cidadãos terão acesso a estes serviços, gerando cidadãos de segunda classe e aprofundando desigualdades. Além disso, o projeto prevê patrocínio de alguns aplicativos de governo, o que significa usar recursos do FUST para criar um modelo que cerceia a liberdade de navegação somente a algumas poucas funcionalidades da web.
O parlamento precisa discutir com o conjunto da sociedade, nos seus diferentes segmentos, através de audiências públicas e diálogos que envolva os diferentes atores. Todos podem contribuir para uma legislação aprimorada que possa trazer ganhos de eficiência ao poder público sem prejudicar a privacidade do cidadão. Ainda que tenha sido produzido na melhor das intenções, apenas uma análise minuciosa do texto poderia sanar dúvidas. Este é um projeto de lei que pode definir a oferta de serviços à população.
Neste sentido, solicitamos aos deputados e deputadas sensibilidade no tratamento da questão. Entendemos que o melhor caminho, neste momento, seria a análise da proposta através de uma Comissão Especial, o que pode dar celeridade e ao mesmo tempo espaço para manifestação dos diferentes interessados na matéria. Desde já a Coalizão se compromete a oferecer subsídios técnicos e contribuições qualificadas para viabilizar uma proposta de consenso, no sentido de contemplar os objetivos da legislação proposta.