A Coalizão Direitos na Rede (CDR) – coletivo que reúne 47 entidades da sociedade civil e organizações acadêmicas que trabalham em defesa dos direitos digitais – vem a público chamar a atenção dos parlamentares sobre o projeto que instituirá o chamado Código Eleitoral, tornado público em 24 de junho de 2021, pela relatora do Grupo de Trabalho, deputada Margarete Coelho (PP/PI).

Tendo em vista o complexo e extenso conteúdo da proposta, a CDR recomenda uma análise ampla e técnica do texto e de seus impactos, buscando a participação de todos os setores da sociedade e do parlamento, o que não poderá ocorrer caso seja confirmada a perspectiva de votação em regime de urgência da proposição.

Reconhecemos muitos avanços presentes no texto; contudo, destacamos os seguintes pontos contendo comentários e recomendações do coletivo a respeito de temas tratados no texto do projeto de lei que, além de sensíveis, deveriam ser objeto de aprimoramentos antes da submissão do texto ao plenário da Câmara dos Deputados:

  • Propaganda eleitoral na internet:  é preciso promover a devida adequação das regras sobre propaganda eleitoral na rede à promoção da liberdade de expressão, da transparência e do enfrentamento à desinformação, bem como  às modalidades de abuso que podem se dar a partir da internet;
  • Proteção de dados pessoais: a privacidade e a proteção de dados pessoais devem ser vistas como pontos estratégicos para que o Novo Código Eleitoral esteja sintonizado com as melhores práticas de uso de dados e tecnologias por campanhas e harmonizado com o arcabouço legislativo brasileiro sobre o tema. A necessidade de aprimoramento da matéria se manifesta tanto na parte principiológica da proposta como na questão sobre a competência para aplicação e regulamentação da LGPD para dar segurança nos tratamentos de dados pessoais por partidos, candidatos e coligações;
  • Regras para provedores de aplicação de internet: é fundamental promover a transparência e as garantias dos usuários para o exercício da liberdade de expressão na rede, mas sem que sejam impossibilitados meios legítimos de moderação de conteúdos por parte das plataformas de internet, como no enfrentamento à violência online, à desinformação e ao combate ao spam, por exemplo. Neste ponto, o texto também precisa estar sensível à pluralidade de atores que compõem o ecossistema digital, evitando regras que não estejam atentas às diferenças de tamanhos e finalidades entre provedores. Ao mesmo tempo, chamamos atenção para que a reforma aprimore seus trechos nos quais estabelece direitos aos usuários das grandes plataformas, para mitigar abusos decorrentes de seus sistemas de moderação de conteúdo;
  • Regras para aplicativos de mensagens privadas: mostra-se importante a discussão sobre a proibição de meios de disparo em massa ou de envio de mensagens a partir do tratamento ilegal de dados pessoais;
  • Responsabilidade, remoção de conteúdos e identificação de usuários de internet: é essencial atentar-se aos modelos de responsabilização de intermediários na internet, em fluxos de remoção de conteúdo ou da requisição judicial de registros para identificação dos usuários, alinhando-os com o modelo estabelecido pela Lei n. 12.965/2014 (Marco Civil da Internet). Nossa preocupação é evitar arranjos que prejudiquem direitos fundamentais dos cidadãos e limitem sua participação no debate político e eleitoral, como regras que dificultem o uso de pseudônimos ou incentivem que plataformas de internet retirem conteúdos a partir de mera notificação extrajudicial de quem é criticado por seus usuários;
  • Crimes eleitorais digitais: é crucial debater o aperfeiçoamento das propostas para combater crimes eleitorais na internet de forma a prevenir a criminalização da livre expressão ou de condutas cotidianas de usuários de internet, bem como enfrentar situações efetivamente problemáticas no âmbito de campanhas eleitorais digitais.

A partir desses pontos, a CDR quer contribuir para que o texto da reforma eleitoral compreenda e abarque os principais aspectos do funcionamento da internet e das tecnologias da informação, trazendo subsídios para que o texto proporcione tanto segurança jurídica quanto proteção aos direitos fundamentais no uso da rede. 

Apesar da urgência da aprovação da proposta, entendemos ser necessário maior aprofundamento e discussão técnica sobre o texto final, sob pena de riscos importantes a direitos fundamentais, como a liberdade de expressão e a privacidade. Nesse sentido, da mesma forma que no debate sobre o PL 6764/2002, que revoga a Lei de Segurança Nacional, também relatado pela Deputada Margarete Coelho, nos colocamos à disposição para dialogar sobre os pontos acima referidos.

Respeitosamente,

Coalizão Direitos na Rede
Brasília, 30 de junho de 2021