Coalizão Direitos na Rede destaca que ausência de pontos importantes do anteprojeto de alteração da lei do fundo no substituto aprovado na Câmara fragiliza as garantias de investimento em áreas necessitadas
O plenário da Câmara dos Deputados aprovou, na segunda-feira (9/12), texto substitutivo ao Projeto de Lei 1481/07 (do Senado), que prevê alterações na aplicação dos recursos do Fundo de Universalização dos Serviços de Telecomunicações (FUST).
O texto, apresentado pelo relator deputado Vinicius Poit (Novo-SP), está baseado em proposta de alteração da lei do FUST desenvolvida pela área técnica da Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) e permite a aplicação dos recursos em ampliação da banda larga em áreas de baixo índice de desenvolvimento e rurais.
As modificações, no entanto, favorecem demasiadamente o agronegócio – em detrimento, por exemplo, da saúde, da educação e das pesquisas científicas – e incluem muitas e variadas opções de apliações do recurso para além das telecomunicações, como “governo digital”, ignorando as balizas para um desenvolvimento estratégico da infraestrutura de telecomunicações inicialmente proposto pela agência como o Plano Estrutural de Redes de Telecomunicações (PERT), previsto na Lei Geral de Telecomunicações.
“É uma boa notícia a possível liberação de recursos para a universalização da infraestrutura que suporta a conexão à banda larga, uma vez que o acesso à Internet é essencial para o exercício da cidadania e que cerca de 40% dos domicílios do país ainda não dispõem deste recurso. Mas nos preocupa que a proposta tenha virado um balaio de gato ao incorporar demandas variadas, sem que haja limites de uso para cada uma das previsões”, explica Marina Pita, integrante da Coalizão Direitos na Rede e coordenadora do Intervozes.
“E mais: que se tenha excluído a necessidade das propostas de infraestrutura de telecomunicações a serem contempladas com recursos do FUST em observar a baliza de um plano estratégico técnico”, complementa.
A Coalizão Direitos na Rede apoiava integralmente o anteprojeto para alteração da Lei do FUST produzido sob o comando do conselheiro Aníbal Diniz, da Anatel, e aprovado pelo conselho da agência. No texto desenvolvido por técnicos da área constava a necessidade de adequação dos projetos, visão estratégica produzida com base em dados, conforme o texto: “Os recursos do Fust serão aplicados em programas, projetos e atividades aprovados pelo Conselho Gestor, com base nos planos estruturais das redes de telecomunicações, a que se refere o inciso IX do art. 22 da Lei no 9.472, de 16 de julho de 1997.”
O atual Plano Estretégico de Redes de Telecomunicações observa, por exemplo, a necessidade de investimento em redes de alta capacidade para conexão dos municípios brasileiros, especialmente no Norte e Nordeste, que suportam a conexão, independente de tecnologia adotada ao consumidor, de qualidade e a mais baixo custo no médio e longo prazos.
“Esta seria uma baliza importante, porque os investimentos seguiriam dados da realidade e as prioridades com uma visão coordenada. Ainda que o Conselho Gestor do FUST tenha que aprovar os projetos, estes têm um escopo muito amplo. E sendo o Conselho Gestor formado majoritariamente pelo Poder Executivo, existe a possibilidade de haver ingerência política na definição dos projetos”, afirma Pita.
A proposta de substitutivo de Poit, apresentada em plenário, excluía a participação de pastas como Educação, Saúde e Defesa do Conselho Gestor do Fundo, e incluía o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento. Esse fato, somado à inclução de dispositivo (Art. 3º do substitutivo que altera o Art. 1º da Lei no 9.998, de 17 de agosto de 2000) para o FUST ser investido em políticas para inovação tecnológica de serviços de no meio rural, aponta para um desequilíbrio entre as áreas priorizadas na proposta.
Em plenário,após pressão de diversos partidos, foi alterada a composição do Conselho Gestor e a área de educação foi incluída, ainda que de forma bastante limitada. Também a possibilidade de uso do FUST para a implementação de estratégia de governo digital foi encaixada de última hora na versão do texto aprovada. E, no entanto, o desequilíbrio com o setor rural permaneceu, na opiniao da CDR.
Em relação à versão produzida pelos técnicos da Anatel, a proposta do deputado Poit ainda ampliou os agentes financeiros operacionais do FUST. Incluiu, além do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e da Financiadora de Estudos e Projetos (Finep), também as caixas econômicas, os bancos de desenvolvimento, as agências de fomento e demais agências financeiras.
Para a Coalizão Direitos na Rede, a pulverização de recursos entre vários agentes financeiros pode comprometer a execução de projetos estruturantes ao país e viabilizar a construção apenas de redes de pequeno porte.
Talvez para satisfazer os diversos agentes financeiros, o avanço tecnológico e a redução das desigualdades do país pode ter sido comprometido.
Entretanto, em se tratando de um cenário em que o governo propõe a extinção do FUST, conforme proposta apresentada em novembro, a CDR considera positiva a discussão legislativa em que o FUST seja direcionado para ampliação da banda larga. Mas, se aprovado no Senado, o projeto exigirá maior esforço em termos de regulamentação e de acompanhamento público – a Coalizão já se coloca a disposição para isso.
Receitas do FUST
As principais receitas que compõem o FUST são a contribuição de 1% sobre a receita operacional bruta decorrente de prestação de serviços de telecomunicações nos regimes público e privado e as transferências de recursos provenientes do Fundo de Fiscalização das Telecomunicações (Fistel). Em 2019, a arrecadação do Fust totalizou R$ 864 milhões, segundo a Anatel.De 2001 a 2019 a arrecadação do FUST somou R$ 21,9 bilhões.